Espiar para fora do mundo da maternidade significa, sem sombra de dúvida e em primeiro lugar, olhar para dentro de si mesma. Não se trata de nada exterior, em princípio, mas interior. Por exemplo, hoje em dia é comum algumas novas mães se obrigarem a sair de casa para fazer alguma coisa (jantar fora com o marido é uma delas), para demonstrarem que estão "se cuidando" e não apenas enterradas no mundo materno. Eu mesma fiz isso quando minha filha tinha cinco meses.
Acontece que eu não estava nada bem naquela época. Sei que é tabu falar de depressão pós-parto, no mundo em que vivemos. As mulheres de hoje estão praticamente equiparadas aos homens em tudo, e por isso talvez se negue a elas o tempo e o espaço de agir com a fragilidade própria da natureza feminina, em situações como pós-parto, por exemplo. É apenas a minha opinião.
Ouço falar de depressão pós-parto com menos frequência do que gostaria. Não porque desejaria que as novas mães estivessem deprimidas, mas porque talvez isso signifique que muitas delas não revelam essa condição. Ou porque não a admitem, ou porque não sabem se devem fazer isso, nem como.
Estou aqui falando de incógnitas. Logo, não posso falar do assunto em termos gerais, mas somente específicos, naquilo que se relaciona à minha experiência.
Anote aí. Quando você fala da sua experiência, é bom que isso seja para ajudar alguém. As pessoas que me falaram de suas experiências de depressão pós-parto não me ajudaram, porque não me disseram o que fizeram para sair daquilo. Sim, você tem que fazer alguma coisa. Senão, fica pior.
Quando a nenê completou trinta dias de vida, meu marido continuava me ajudando tanto como nos primeiros dias. Embora muita gente tenha estranhado isso, na época, era complicado explicar para os outros o que estava se passando comigo, o motivo por que eu ainda não tinha me "restabelecido totalmente". Não tinha nada a ver com a cicatrização da cesária, que ia bem, mas com todo o resto. Era todo o ser emocional, que estava oscilando entre dois pólos: cansaço e culpa.
O cansaço decorrente da dedicação, da rotina, das preocupações. A culpa, nos momentos de "descanso". Ou seja, eu trabalhava e não descansava, porque todo o meu tempo era ocupado com culpa e preocupação. Com e por quê? Com e por tudo. Tudo o de ruim que existe nessa vida e nesse mundo. Com o fato de não poder fazer nada para evitar que uma mazela qualquer dia viesse a atingir a minha cria. Desastres, pesadelos, doenças, morte. Tudo me ocupava e preocupava.
A especialista me falou que a principal característica da depressão pós-parto é a falta de esperança. Digamos que tudo se resumisse nisso.
Mas a questão principal é: Há lugar para uma mãe que se sente assim? Estando saudável e tendo um bebê também saudável?
Há lugar. Tem que haver. Se não há, tem de ser criado. Por você mesma.
E aí me atrevo a dar os conselhos que talvez possam ser úteis a alguém, porque foi o que eu fiz para sair da prisão da culpa e do cansaço.
Se o seu corpo todo dói, se você não dorme, se suas roupas e sapatos não servem mais, saiba que você não é apenas o corpo.
Se sua mente não está funcionando direito, se sua emoção tem armadilhas que te prendem, saiba que tudo isso tem jeito se você tomar as rédeas da situação.
A primeira coisa é: ignore bastante o que pessoas te falam. Lógico, elas não falam nada por mal, mas por bem. Mesmo assim, atrapalha. A questão é que você não pode depender do que os outros acham, mas do que você sente. Por exemplo, a frase que mais ouvi naquela época, em primeiro lugar disparado, foi: "Cuide de si mesma para estar bem e cuidar de seu bebê" . Essa inocente frase também é uma pequena armadilha. Porque a partir do momento em que você deixa de cuidar de si mesma, sente culpa por estar se limitando como "ferramenta" para os cuidados do bebê. Olha a culpa aí de novo...
Então, apenas cuide de si mesma. Não pelo bebê, nem por outra pessoa. Por você, apenas. O resto, como os cuidados ao bebê, é consequência.
Mas afinal de contas o que é cuidar de si mesma?
Para você, eu não sei. Para mim, eu também não sabia e tive de descobrir.
Não era jantar fora, com certeza. Não era ir ao cinema nem ao parque.
Para a mente, fiz algumas coisas. A primeira foi falar sobre o que estava acontecendo comigo. Eu procurei uma especialista, uma psicóloga. Tive a sorte de encontrar alguém que entendeu o meu problema e me acompanhou. Se você tem preconceito contra submeter-se a terapia, eu lamento o que você pode estar perdendo. Se você acha que isso é coisa de gente doida, eu acho que quem não faz terapia tem muito mais chances de estar doido. E nem saber da própria doidura.
A segunda coisa que fiz foi algo que me traz bastante tranquilidade: ler. Mas não ler livros sobre maternidade. Uma das leituras mais proveitosas que fiz foi o best seller "O poder do hábito". Aos poucos, lendo devagar, levei vários meses para concluir o livro. Também, eu não estava com pressa. Claro, você pode e deve ler qualquer livro que goste, isso tem mais a ver com suas preferências pessoais. Eu gostei desse livro porque não era uma autoajuda infantilizante, nem algo que me fizesse sentir pena de mim. O estilo do autor é objetivo e bem prático, com muito embasamento científico. Acho que o assunto, em si, é interessantíssimo. E pode eventualmente te ajudar a entender seus hábitos e mudá-los.
A terceira coisa que fiz foi procurar algo que me fizesse rir. Naquela época eu sentia muita saudade do ambiente profissional. Sinto até hoje, na verdade, mas aprendi a lidar melhor com isso. Sempre trabalhei fora ou estudei, de forma que ficar o dia inteiro em casa e não ter ânimo para nada era algo que me abatia. Eu tinha que arrumar um jeito de lidar com isso. Sabe o que fiz? Toda a noite depois que a nenê dormia, eu assistia "The Office" no Netflix. Posso dizer, sem nenhum constrangimento, que Steve Carell me ajudou a sair da depressão pós-parto. Ri litros, como dizem as pessoas jovens.
Mas é claro, você pode assistir aquilo com que mais se identifica. Tem gente que gosta de comédia stand-up, tem gente que prefere Walking Dead ou American Next Top Model. Seja lá o que for, deixe sua mente se distrair um pouco da vida materna, experimente outras emoções que não estejam tão relacionadas à sua nova condição. Mesmo que isso ocorra na última meia hora do dia.
Dica: não assista vídeos de parto, nem nada sobre bebês.
Bem, essas coisas eu fiz para a mente. Para o corpo, contei com a ajuda do Pilates. Não que eu buscasse voltar ao meu antigo corpo, nada disso. Minha condição emocional nem me permitia acreditar nessa possibilidade. É que eu precisava fazer algo que já tinha feito antes. Quem me ajudou foi minha fisioterapeuta, hoje minha amiga também. Cinco meses após o parto, procurei o estúdio e ela me avaliou. Na primeira aula, disse assim:
- Agora você vai fazer dez abdominais.
- Mas eu não consigo.
- Consegue.
Eu fiquei parada.
- Vai. Pode fazer.
Eu fiz. Porque acreditei.
Aquilo não parecia ser nada para quem estava olhando. Mas para mim, era muita coisa.
Era a minha primeira flexão abdominal após o parto. O que senti, naquele momento, era que estava voltando à vida. Que minha barriga não era mais apenas um "ex-container de bebê", agora desocupado e acabado, pois tinha músculos. Não estavam na melhor forma, mas eram capazes de fazer uma flexão abdominal. Duas. Dez.
Na outra aula, fiz vinte. Passado algum tempo, trinta, quarenta.
Noventa. Eu sou o máximo.
Era o Pilates me fazendo voltar a ser quem eu era. Quem eu sou. Mesmo que essa barriga anida esteja por aqui, mesmo que as roupas de antes ainda estejam guardadas, eu posso dizer que voltei à vida.
Porque agora eu tenho esperança. Porque agora minha mente descansa, porque eu trabalho e durmo, porque eu aprendo e ensino. Porque eu leio, escrevo, falo, mas também escuto.
Porque eu sou mãe, mas também sou e não sou quem costumava ser. Somado àquilo que ainda estou me tornando.
Ainda nem sei o que é. Mas tenho um bom pressentimento.
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